é a voz de uma menina de 6 anos a falar com a mãe ao telefone. Está aterrorizada, presa dentro de um carro. Todos à volta dela estão mortos – o tio, a tia e dois primos.
“Por favor. Sou pequenina. Mamã, tenho fome, tenho frio. Fiz chichi nas pernas. Está a ficar escuro, tenho medo do escuro. Tenho medo. Por favor, vem-me buscar.”
Chama-se Hind (ou chamava-se? Não se sabe). Quando as tropas israelitas mandaram evacuar a zona, a mãe de Hind decidiu seguir a pé para sul, à procura de maior segurança. Pediu ao irmão que levasse no carro a filha mais pequena. Daí a pouco ouviu tiros para os lados por onde eles tinham saído. Depois tocou um telemóvel e uma das primas de Hind que ia no carro disse ao primo que tinham sido atingidos por tanques israelitas. O pai, a mãe e o irmão estavam mortos. “Estou a perder sangue. Estou a morrer. O tanque está aqui ao pé”, disse ela. Depois ouviu-se uma rajada de tiros. Um grito de dor horrível. E depois mais nada. Só a voz do primo: “Está? Está?” Mais nada. Foi então que se ouviu a voz da pequena Hind. Procuraram mantê-la ao telefone. Durante horas. O Crescente Vermelho palestiniano (uma organização semelhante à Cruz Vermelha) ficou a tentar consolá-la, enquanto tentavam receber autorização para a irem buscar. Jornalistas da CNN contactaram as forças israelitas. Deram-lhes as coordenadas do local (31º30’49.4 N; 34º26’13.0 E), mas a resposta do porta-voz do Exército israelita foi apenas: “Não estamos a par do incidente relatado”.
Ao fim de cem dias de guerra, a BBC fala em 24 mil mortos em Gaza. Um número. Gideon Levy, jornalista do jornal israelita Haaretz fala em 5 mil crianças mortas. Um número. Mas aqui há mais do que um número: há um nome. Uma voz. E esta voz agora não me sai da cabeça.
