Estive agora mesmo a ler uma história daquelas de que não se sai ileso. Uma rapariga de 21 anos conta o cativeiro e as torturas a que foi sujeita durante 54 dias nas mãos de um impiedoso grupo terrorista. Encontrava-se num festival de música no sul de Israel, num kibutz próximo da chamada Faixa de Gaza, quando uma vaga de milhares de homens armados irrompeu imprevistamente e desatou a matar indiscriminadamente quem lhes aparecesse pela frente. Morreram assim muito mais de mil pessoas. Sem nenhuma provocação direta, nem nada que fizesse prever o ataque. Foi depois perseguida, ferida com um tiro à queima-roupa num braço, arrastada pelos cabelos, levada para um esconderijo em Gaza, sujeita a um curativo improvisado sem nenhum meio de anestesia, entregue a uma família simpatizante do Hamas, onde foi mantida dias sem comer, com uma ferida aberta no braço, sujeita a incessante assédio, e todo o tipo de insultos e torturas. Mia Schem, assim se chama ela, tem dupla nacionalidade franco-israelita. Talvez isso lhe tenha valido ser uma das primeiras pessoas reféns do Hamas a ser libertada. Dirá depois: “Era o inferno. Todos ali são terroristas… não há civis inocentes, nem um. É coisa que não existe.”
Que mais poderia ela dizer?
Não é verdade, sabemos que não é assim, mas que mais poderia ela dizer? E logo ali ao virar da esquina, num outro quarteirão da internet, num artigo da Newsweek, dou com a história de Hamza Howidy, um rapaz que nasceu e cresceu em Gaza no meio do horror imposto pelo Hamas, das restrições e das limitações de todo o género, onde a dissidência se pagava caro. E Hamza é um dos que o pagou com prisão, com tortura, com perseguições. Fala de amigos dele que pagaram com a morte quando tentaram fugir. E que no entanto diz ainda agora: “Espero que depois da guerra, depois de o Hamas ser derrotado, sejamos capazes de criar uma paz duradoura tanto para palestinianos como para israelitas. Há muitos em Gaza que rezam por isso também.”
De longe, porém, sentimos o ódio a alastrar. De um lado e de outro. As soluções, se as há, terão de surgir de quem tem a força para as impor ou negociar, pensamos. E que vemos nós? O Governo de Israel a negociar com o Congo a emigração “voluntária” dos habitantes de Gaza a seguir à guerra.
“A seguir à guerra – é um Ministro israelita quem o diz – o governo do Hamas ruirá. Não haverá autoridades municipais; a população civil estará inteiramente dependente da ajuda humanitária. Não haverá trabalho, e 60% das terras cultiváveis serão transformadas em zonas tampão de segurança.” Gaza estará praticamente reduzida a escombros, Israel criará novas zonas-tampão ao longo dos 14 quilómetros de fronteira com o Egipto e estabelecerá um bloqueio naval permanente. Diz o Ministro Gila Gamliel que não se pode deixar os habitantes de Gaza aí, a serem educados no ódio, que em breve alimentaria novos ataques. Há em Israel quem advogue a ocupação de Gaza com criação de novos colonatos. Dois deputados, um do partido do Poder e outro da oposição, assinam um artigo de opinião, no americaníssimo Wall Street Journal, a sugerir a relocalização dos habitantes de Gaza. Mas fora de Gaza.
A solução, afinal…